sexta-feira, 3 de maio de 2013

Gracejo homofóbico gera assassinato de homossexual em São Gonçalo
Assassino acaba de ser identificado, diz delegado
*por Well Castilhos

Uma provocação de conotação homofóbica foi o estopim de uma briga que terminou no assassinato de um jovem homossexual no bairro do Alcântara, em São Gonçalo, na madrugada da última segunda-feira (29/04). Hoje, eu e Cláudio Nascimento, coordenador do programa estadual Rio sem Homofobia, estivemos reunidos com o delegado titular da 74ª DP (Alcântara), Jorge Veloso, que investiga o caso. O delegado iniciou a conversa afirmando não se tratar de um crime de motivação homofóbica. De acordo com o seu relato, o jovem Eliwelton da Silva Lessa, de 22 anos, estava acompanhado de dois amigos num ponto de ônibus na Estrada Raul Veiga quando um homem que passava a pé, de aparentemente 40 anos (segundo relataram os dois amigos da vítima à polícia), provocou os três e jogou um beijo para Eliwelton. O rapaz se irritou com o gracejo e agrediu o homem que o provocara. O homem, então, pegou uma barra de ferro para revidar, mas foi impedido por outras pessoas que estavam na rua.

Cerca de 30 minutos depois, ele voltou dirigindo uma van, invadiu a calçada, atropelou Eliwelton intencionalmente e fugiu. Por isso, o delegado acredita não se tratar de um caso de homofobia, mas sim de vingança. O PROBLEMA ESTÁ AÍ. É incrível como banalizam e naturalizam as provocações e chacotas contra gays e mulheres nas ruas (beijinhos, “fiufiu” etc). O crime pode ter sido por vingança sim. Mas não há dúvidas – e disso o delegado Veloso acabou concordando conosco, depois de mais de uma hora de conversa – de que o elemento inicial e provocador do crime foi o fato do homem – que não conhecia nenhum dos rapazes – tê-los provocado, jogando o beijinho. Esse tipo de provocação passa despercebida pelas pessoas (que até acham graça, normal e não dão a devida importância), mas para quem sofre a provocação, dói na alma (só quem passou ou passa por isto sabe).

Obviamente que o homem só jogou o beijinho ao jovem porque percebeu que ele era gay, da mesma forma que pai e filho foram agredidos no interior de São Paulo por estarem abraçados e os agressores terem pensado que eram um casal de homossexuais. Trata-se do imaginário social machista, homofóbico e racista que qualifica mulheres, gays e nordestinos como pessoas fracas, com as quais se pode mexer e humilhar e torná-las motivo de chacota, especialmente quando há um público para assistir (no caso em questão, o homem estava acompanhado de um carroceiro, a quem ajudava). Um exemplo: recentemente, três jovens norte-americanos estupraram uma moça e jogaram o vídeo na internet. Na avidez de mostrar a dominação e humilhação ao mundo, esqueceram-se que estupro é crime.     

O delegado do caso acontecido em São Gonçalo informou que, embora ainda não exista um amparo legal no Brasil para a população LGBT (a homofobia ainda não é crime no país), como existe para as mulheres (Lei Maria da Penha), os gays, as lésbicas, as travestis e os/as transexuais podem, em vez de revidar à provocação, procurar a polícia e dar parte do provocador por crime de injúria. Mas será que, justamente pela banalização social deste tipo de provocação, a polícia acolheria a denúncia? 

Não quero justificar o fato de o rapaz ter revidado a provocação com agressão física ao homem, mas sabe-se lá quantas vezes em sua vida ele pode ter sido vítima de chacotas do tipo. Talvez tenha chegado ao seu limite. Concordo que, ao se deparar com este tipo de situação, não se deve revidar, e sim buscar o estado de direito. Mas para isso, todos temos que colaborar, inclusive um delegado de polícia, que deve se esforçar mais para enxergar a homofobia escondida nas entrelinhas de determinadas situações corriqueiras em suas delegacias. Enquanto isso não acontecer, como nos sentiremos à vontade para procurar amparo na polícia quando sofrermos esse tipo de “gracinha” vinda de pessoas que nem ao menos nos conhecem?

Tenho certeza que o delegado Jorge Veloso, em sua experiência e notória sensibilidade ao tema (notei que ele, em todo o tempo de nossa conversa, usava corretamente o termo “orientação sexual”) é um de nossos aliados nesta causa. A prova de seu interesse em elucidar o caso é que agora, às 21h58 desta sexta-feira, quando terminava de escrever este texto, recebi um telefonema do delegado Veloso que me informou que o assassino já foi identificado: seu nome é Helio Galdino Vieira, 38 anos. A polícia espera agora o juiz expedir o mandado de prisão, e Galdino passa então a ser foragido.  Já há inclusive um retrato seu em posse da polícia. Conto com a participação de tod@s na disseminação destas informações. Postarei a foto assim que a tiver.

*Well Castilhos é jornalista, especialista em gênero e sexualidade pelo CLAM/UERJ, fundador do Grupo Liberdade de Direitos Humanos de São Gonçalo e Superintendente de Políticas da Sexualidade da Secretara de Direitos Humanos de Maricá.

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