A PRAÇA É NOSSA!

Na definição de dicionário, praça é uma área urbana arborizada com bancos, jardim, chafarizes e coreto, para descanso e lazer. Se houver música e arte, melhor ainda. Não à toa que a recém reformada Praça Zé Garoto (ou Estefânia de Carvalho), cravada no centro de São Gonçalo, foi o lugar escolhido para celebrar, pela primeira vez na cidade, o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica (29 de agosto), com um show de voz e violão da cantora Nise Palhares na sexta-feira, 28/8. Ela, acostumada a cantar em bares, boates e outros locais fechados, cantou Isabela Taviani, Cássia Eller, NX Zero, Seu Jorge e outros bem à vontade com seu violão, no coreto da Praça! O público era composto de 80% de jovens (majoritariamente heterossexuais) freqüentadores habituais do local às sextas. Mas a minha maior vontade era que as meninas (as lésbicas mais jovens que compõem a maioria do público de nossas Paradas LGBT em São Gonçalo) viessem e se sentissem à vontade para beijar e namorar suas namoradas em frente ao coreto/palco.

No entanto, parece que no início as pessoas que estavam por lá, ao perceberem se tratar de algo gay – ora, não enchemos o coreto de arcos de bolas coloridas não, mas penduramos uns banners no coreto sim – não nos deram muita bola. Permaneceram onde estavam – à distância! Iniciei o show falando do Projeto “Elas na Praça” e sobre o que estávamos prestes a comemorar. Por incrível que pareça os únicos espectadores iniciais era um casal jovem – heterossexual, um rapaz de boné e uma moça loira – bem apaixonados, tipo início de namoro! Tanto que pedi à Nise que oferecesse uma música a eles...

Mas logo os “moderninhos” foram chegando – meninas com meninas e uns rapazes amigos – que foram compondo os outros 20% de nossa audiência. E ficaram ali, em frente ao palco/coreto. Pronto! Já estava realizado o meu sonho! Não temos certeza, mas talvez essas pessoas tenham sabido do show através de nossa rápida divulgação pela nossa comunidade no Orkut. O fato é que eles se misturaram – o casalzinho permaneceu ali – com o resto do público. A essa altura, as outras pessoas da Praça também já estavam à vontade, cantando, oferecendo músicas a namorados e namoradas. “Meninas e meninos, meninas e meninas, meninos e meninos. Não é difícil entender, a equação é simples. O nome disso é DIVERSIDADE!”, dei o recado sob aplausos de nosso público.

Em determinado momento, um rapaz subiu ao palco querendo saber como ele podia realizar um evento como o nosso (em seu caso, um show de rock). Dei a ele as dicas, claro, fazer a parceria com a Secretaria de Cultura do município. Mas me lembrei que talvez esta informação talvez fosse ser útil a outras pessoas ali. Então, num intervalo do show da Nise, antes que ela cantasse a saideira, peguei novamente o microfone e dei um novo recado: “Qualquer um de nós pode trazer para esta praça uma atividade cultural e ninguém tem o direito de negar isso. A praça é do povo, a Praça é nossa! Este é um espaço público que temos o direito de ocupar. Basta ir à Prefeitura e levar um projeto, não para pedir, mas sim para propor uma parceria”.

E assim foi a noite. Até às 22h, horário em que a Praça fechou. Estava lançado o Movimento de Lésbicas de São Gonçalo! E depois, o mais bonito (e gratificante!) foi quando o público eclético (heteros e homos) quis saber quando faríamos o próximo.... Ausência sentida de lésbicas famosas da cidade. Vergonha, talvez? Parece que as mais jovens têm mais coragem de se assumir....

Bacana também foi quando, ao final do show, Nise me falou sorrindo: “Você é maluco”. Maluco no sentido figurado (lógico!). O que ela quis dizer era que estávamos sendo ousados em falar em LÉSBICAS e DIVERSIDADE SEXUAL para pessoas que só estavam ali na praça em suas rotinas de uma sexta-feira à noite, sem se preocupar com os problemas do mundo. Parecíamos aqueles pastores de igrejas evangélicas que vão para as praças propagar sua fé. Também estávamos propagando nossa fé – fé em um mundo melhor sem preconceito, discriminação ou violência sexual. Todos - líderes LGBT e líderes religiosos - temos o direito de ocupar praças para darmos nosso recado. Afinal, a praça é de todos. A PRAÇA É NOSSA!

Depois que escrevi as linhas acima soube que um sujeito (que até se diz do movimento LGBT da cidade, embora ele ache que, por pertencermos a grupos diferentes, estejamos em lados opostos) foi até à prefeita Aparecida Panisset e disse que o evento tinha sido tumultuado e colocado o patrimônio público em risco. A prefeita chamou então (na terça-feira, 31 de agosto) o secretário de Cultura, Carlos Ney, para “uma conversa”, questionando-o se a secretaria de Cultura tinha mesmo “compactuado” com aquilo. Disse que nem o "pessoal de Igreja" fazia qualquer evento na Praça ZÉ Garoto. ORA, PREFEITA, primeiramente como governante a sra. não deveria dar ouvidos a qualquer um que lhe diga coisas, sem antes investigar. Também como PREFEITA, a sra. deve ter em mente que governa para tod@s e que a praça é um lugar de todos os cidadãos e cidadãs, não pertence à prefeitura ou qualquer secretaria, seja ela de SAÚDE ou de CULTURA. Se o povo de Igreja ainda não fez evento na Praça, deveria, pois têm todos os direitos. O POVO QUE A ELEGEU TAMBÉM É DONO DA CIDADE E TEM O DIREITO DE SE EXPRESSAR. SEJAM DE IGREJA OU NÃO, AS PESSOAS TÊM A LIBERDADE DE EXPRESSÃO. A Prefeitura precisa saber que “a gente não quer só comida, a gente quer comida, DIVERSÃO e ARTE” (Titãs).